sábado, 23 de agosto de 2008

O divórcio na lei

O veto do Presidente da República traz para a discussão pública a lei sobre o divórcio. Os defensores da lei acusam os seus detractores de terem uma concepção retrógrada mas, por vezes, são esses defensores que parecem medir a qualidade da lei apenas pelas reacções que suscita em determinados sectores.


Ora as objecções levantadas à lei são demasiado sérias para que se possa manter o debate neste nível.


Em primeiro lugar já há experiência suficiente em Portugal de leis e de reformas "progressistas" que só prejudicaram o país (veja-se o caso da educação onde com frequência uma nova reforma é concebida ainda antes da anterior estar completamente concretizada, quanto mais avaliada). Numa área sensível como o direito da família parece mais sensato avançar por pequenos passos do que revolucionar tudo de uma vez.


Em segundo lugar a lei é acusada de vir a aumentar a litigância, entupindo ainda mais todo o sistema judicial.


Em terceiro lugar a lei chega a fazer imposições estranhas, como a de que "Em caso de divórcio, nenhum dos cônjuges pode na partilha receber mais do que receberia se o casamento tivesse sido celebrado segundo o regime da comunhão de adquiridos." (art.º 1790) Consideremos um casal em que um tem mais bens do que o outro e que casa em comunhão geral de bens. Se no divórcio pretenderem de comum acordo uma divisão em partes iguais, porque é que a lei os há-de impedir de o fazer?


Finalmente o Presidente da República considera que a lei diminui a protecção do cônjuge mais fraco.


Globalmente fica a impressão de que a tendência desta lei é para considerar o casamento como uma união de facto, retirando-lhe o conteúdo de contrato legal.


Perante a seriedade destas questões, seria de esperar que o debate incluísse estudos detalhados sobre os esfeitos da lei. E seria possível fazê-lo, porque muitos destes aspectos não são inovações: outros países têm legislações com pontos comuns com esta lei e seria necessário averiguar qual o impacto que tiveram nesses países e tentar avaliar as diferenças para Portugal. É que o que resultou bem em culturas diferentes pode não resultar bem em Portugal.


Nestas questões nem tudo o que parece é. O divórcio unilateral não deixa necessariamente mais desprotegida a mulher vítima de violência conjugal. Há pelo menos um estudo feito com base em dados dos EUA que indica que, quando o divórcio pode ser obtido apenas com a vontade de um dos cônjuges, diminuem os problemas de violência doméstica, incluindo os suicídios e os homicídios de mulheres.


Estou convencido que a promoção da família não passa tanto por esta lei como por melhorar as condições de vida e melhorar as competências de relacionamento interpessoal das pessoas. Mas uma lei mal ajustada à realidade pode complicar bastante a vida a muita gente.


Espero que se continue a trabalhar este assunto porque me parece que melhor é possível.

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