domingo, 7 de setembro de 2008

Bairros Sociais - Demolição ou Reabilitação?

Num tempo em que a criminalidade surge constantemente associada aos bairros municipais, e sabendo que em Portugal, nos concelhos de Lisboa, Porto e Setúbal, existem cerca de 110 “bairros problemáticos”, como tal referenciados pelas forças policiais, surge a questão de saber como tratar o problema.

Sabe-se que os municípios não dispõem de capacidade financeira para reabilitar por si os bairros mais degradados e que as rendas sociais raramente são cobradas ou o despejo efectivado na falta de pagamento. O clima que aí se vive – de verdadeira segregação social - não permite uma sã convivência com as tradicionais regras e posturas municipais.

A demolição e consequente realojamento dos moradores nos bairros menos degradados tem surgido como a solução economicamente mais vantajosa, mas existe o perigo de, ao resolver um problema, estar-se a criar outro problema. A tentação dos municípios é obter o máximo de receita, demolir os bairros cujos terrenos tenham maior valor no mercado imobiliário e transferir os moradores para os bairros periféricos das grandes cidades. Acontece que, juntar pobres a pobres e ricos a ricos, aumenta as assimetrias sociais e pode gerar, como aconteceu, noutros países (Brasil) um aumento exponencial da violência.

O policiamento de proximidade e a colocação de câmaras de vigilância nos bairros municipais, se bem que sejam boas medidas, isoladamente também não chegam para solucionar o problema.
Por resolver continuará a questão habitacional.

A meu ver, é necessário uma política diferente, de verdadeira coesão e intervenção social.

Vi há dias no noticiário da televisão que tiveram a iniciativa de organizar uma passagem de modelos no Bairro do Lagarteiro, no Porto, que tem entusiasmado os moradores, especialmente os mais novos que, em tempo de férias e sem actividades escolares, costumam ser fonte de habitual preocupação dos pais. É de louvar!

Temos conceituados arquitectos e engenheiros que poderiam revolucionar os bairros sociais com habitações economicamente sustentáveis, tornando-as amigas do ambiente e um exemplo para o urbanismo português, à semelhança do que do melhor existe no Norte da Europa. Fundos de ajuda internacionais, parcerias com os privados e ONG´s poderiam ajudar a resolver a questão do necessário financiamento.

A par da dignificação da habitação social, deveríamos combater seriamente o abandono escolar e a violência doméstica, incentivar o desporto de bairro e ajudar à criação de uma consciência cívica de responsabilidade pelo património e pela segurança municipal.

A organização de eventos, sejam passagem de modelos, organização de feiras ou festivais de música, poderia abrir as “portas do bairro” à comunidade em geral e seguramente que faria diminuir a marginalidade social.

Só envolvendo e cuidando dos moradores do bairro, chamando-os a participar na cidade, e reconhecendo-lhes a sua identidade e pluralismo cultural, podemos fazer com que as pessoas se sintam integradas e úteis à sociedade.

São centenas de pessoas que vivem em más condições, sem recursos financeiros, mas gente boa que não gosta de conviver com o tráfico da droga e a violência, e que merecem uma política diferente, de maior coesão social.

Melhor é possível!


3 comentários:

Unknown disse...

Querido Sebastião.
Tens razão no que dizes, mas esta já é uma reflexão antiga...
É preciso trabalhar de dentro para fora, e não de fora para dentro. Isto é, "lavar a cara dos bairros" não basta, é importante trabalhar a forma de viver em comunidade na cidade, o sentido de cidadania, a valorização dos talentos escondidos de cada um, mas isso, acredita, é muito muito difícil...
Basta ver o exemplo da Gebalis em Lisboa.
A intervenção ao nível físico é, sem dúvida, importantíssima - a requalificação que temos visto proliferar-se pela cidade do Porto, por exemplo, tem sido, a meu ver, fantástica - este tipo de accção, parecendo que não, intervém também na forma de vida das pessoas; têm mais luz, mais condições, mais «aspecto de casas normais»; isto dá-lhes mais auto-estima, mais sentido de pertença e de cuidado com o que é seu.
Mas, como dizes, é preciso mais... É preciso entrar e transmitir valores... E também consciencializar cada vez mais as pessoas de que as coisas na vida têm de ser conquistadas, que têm de lutar por elas, embora "tenham direito a elas". A fronteira entre uma coisa e outra é muito ténue...
Mas, como fazê-lo?
Continuemos a reflexão...
Obrigada por trazeres este tema à mesa.

(By the way: pode-se aparecer no congresso do Mec sem ter qualquer vínculo?)

Maria Lopes.

Anónimo disse...

Caro amigo Sebastião,

Lancei-me ao desafio de comentar o teu post. Como sabes, sou um atento e preocupado cidadão desta cidade invicta e, é-nos muito mais fácil argumentar e abordar um problema quando vivemos a realidade ao nosso lado e não distante a 300Km. Daí a minha preferência pela política local à política nacional.

Entrando agora no tema que abordas, não deixas de ter razão que a necessidade de intervenção não será apenas estruturalmente física mas também estruturalmente social. No entanto, o problema do Aleixo começa por ser estruturalmente físico, ie, a concepção arquitectónica das torres e envolvente sofrem de um problema genético: a construcção em altura e os acessos restritos.
Logo aí há necessidade de intervenção.
Para além destes problemas, que caracterizam o bairro de maneira a este se trasformar fisicamente numa espécie de ghetto, as próprias torres, pela forma atabalhoada como foram "apropriadas" pelos seus pouco legítimo-proprietários, levaram a que a própria manutenção das torres esteja em causa.
Ou seja, as condições estruturais, físicas, onde nasceram as torres fizeram o que elas hoje são.

Depois, como em todos os bairros, há gente boa e gente má. E, enquanto que à gente boa nós desejamos longa vida, da gente má queremos distância. E, tal como num cancro, as células malignas são mais fortes e espalham-se muito mais rapidamente, infectando as células boas. Logo, todo o organismo do bairro está em causa.
Tal como no cancro, em que não há uma cura inequívoca para fazer desaparecer as células cancerigenas, também aqui não não há solução 100% eficaz.´
Sendo pragmáticos e directos, o problema do aleixo é o tráfico de droga e os drogados, e todos os negócios ilegais paralelos que se organizaram em volta destes: tráfico de armas, roubos, assaltos.
Estes cancros do bairro existem porque as condições estruturais do bairro são ideais para que eles existam. Basta falar com moradores vizinhos para saber que os "senhores do bairro" organizaram canais de comunicação de aviso rápido no caso da polícia estar a entrar nas ruas em redor do bairro, espalhando os seus párias nas esquinas das esguias ruas que o circundam.
Ou seja, é sem dúvida necessária a reestruturação física do bairro.
E tal como no cancro, e nos processos de quimioterapia, para matar as células cancerígenas, muitas células "boas" de tecido "bom" são afectadas, tudo isto, com vista a um bem maior, a sobrevivência do corpo.
No caso do Aleixo, os legítimos proprietários das casas municipais certamente que ficariam contentes em mudar para habitações novas, não deslocados para fora do Porto, onde tivessem boas condições de vida. Mas tristes ficariam os "senhores do bairro", alguns ilegítimos-proprietários de fracções, que gozam as óptimas condições para manterem os seus negócios mais duvidosos.

Ou seja, se a polícia e as autoridades não conseguem correr do bairro com os traficantes, a droga, os párias e os ilegítimos-ocupadores do patrimonio municipal...

O problema estruturalmente-social também é importante e pode e deve ser atacado. No entanto, todos os esforços nesse sentido, na minha opinião, seriam em vão se se mantiver o problema estrutural-físico do bairro.
Todas as acções sociais são mais eficazes se aplicadas num grupo mais pequeno de "alvos" dessa acção. Ora, no Aleixo, já me parece dífícil que isso seja conseguido, agora que o cancro já lá está bem enraizado.
Assim, defendo todas essas acções sociais nos locais e bairros onde o cancro ainda não está bem disseminado e onde ainda não há metástases.

Claro que o diálogo com os habitantes locais é essencial para se chegar a uma conclusão. Mas não estará a opinião destes também infectada por outros senhores mais dominadores?

Portanto, não vejo esta solução apenas como economicamente mais vantajosa, mas sim como uma solução estruturalmente necessária.

É apenas a minha humilde opinião.

Um abraço,
ABM

Rui NS disse...

Maria,
Pode assistir ao congresso como observadora. Caso seja essa a sua intenção, entre em contacto comigo (rnsilva@mep.pt)