sexta-feira, 12 de setembro de 2008

A “FAGMILIA CRISTIANA” ITALIANA E OS IMIGRANTES - UM EXEMPLO DE CORAGEM

" Primeiro vieram atrás dos Comunistas e eu não os defendi porque não era Comunista. Depois vieram atrás dos Judeus e eu não os defendi porque não era Judeu. Depois vieram atrás dos Católicos e eu não os defendi porque era Protestante.Depois vieram atrás de mim, mas nessa altura, já não havia ninguèm para me defender» ( Pastor Martin Niemsller- 1945- capitão de um submarino alemão durante a II Guerra Mundial que se tornou Pastor. Apoiou inicialmente os Nazis mas afastou-se em 1933. Foi detido em 1937, condenado por traição e enviado para um campo de concentração, onde permaneceu até ao final da II Guerra Mundial)
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“Estes direitos (direito a ter uma pátria própria, a vier livremente no próprio país, a conviver com a própria família, a desenvolver o próprio património étnico, cultural, direito à dignidade, entre outros...) encontram uma concreta aplicação no conceito de bem comum universal. Isso abrange toda a família dos povos, acima de todo o egoísmo nacionalista. É neste contexto que se considera o direito de emigrar. A Igreja reconhece-o a cada homem no duplo aspecto da possibilidade de entrar num outro à procura de melhores condições de vida. Certamente, o exercício de tal direito deve ser regulamentado, porque uma sua aplicação indiscriminada originaria danos e prejuízos ao bem comum das comunidades que acolhem os migrantes. Frentes ao emaranhado de muitos interesses, ao lado das leis de cada país, são precisas normas internacionais capazes de regulamentar os direitos de cada um, assim como para impedir decisões unilaterais com prejuízo dos mais fracos”. (02.02.2001 – Mensagem do Papa João Paulo II para o Dia do Migrante e Refugiado)
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Num editorial recente, a revista Família Cristã, assinado por Beppe Del Colle, lançou novas críticas ao governo Berlusconi a respeito de recentes medidas contra a imigração ilegal adoptadas em Itália e desejou que "não seja certa a suspeita" de que na Itália esteja a renascer o fascismo "sob outras formas".
É claro que o governo de Berlusconi haveria de protestar e, de facto, protestou.
Sucede que o próprio Vaticano, através do porta-voz, veio também esclarecer que a revista não representa a "linha da Santa Sé nem da Conferência Episcopal Italiana (CEI)" e que "suas posições são, portanto, responsabilidade de sua direcção".

Num editorial sem assinatura, a revista enfatiza a sua autonomia deste modo: "Família Cristã nunca pretendeu expressar a linha política da Santa Sé e da CEI, que possuem os seus próprios jornais, mas procurou sempre orientar-se pelo princípio 'in certis oboedientia, in dubiis libertas', confirmado pelo Concílio Vaticano II: total, apaixonada fidelidade à doutrina da Igreja, liberdade de juízo sobre as questões políticas e sociais até onde não tocam os princípios e os valores 'irrenunciáveis' que descendem do Evangelho".
No editorial refere-se que a imprensa católica, ao contrário de "quase todos os outros meios de comunicação, não tem por trás nenhum conflito de interesse, público ou privado, não tem ligações nem económicas e nem políticas com nenhum grupo hegemónico na sociedade civil".
A revista defende-se ainda das respostas do actual governo lembrando que também criticou o Governo de Romani Prodi, sobretudo na questão da legitimação das "uniões de fato", assim como agora denuncia a iniciativa de Berlusconi de registar as crianças ciganas.
"Acreditamos não poder omitir nossa oposição”, afirma o editorial, sublinhando o direito de, em democracia, “expressar em plena liberdade os próprios juízos críticos, com base em princípios e valores, no nosso caso, os cristãos, compartilhados por muitos cidadãos".
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Os imigrantes fazem parte da solução, não do problema.

A este propósito ocorre-nos que nunca será por demais recordar as palavras do ex- secretário-geral das Nações Unidas, Kofi A. Annan(2002):

“Um dos maiores testes a uma União Europeia alargada, nos próximos anos e décadas, será a maneira como gere o desafio da imigração. Se as sociedades europeias estiverem à altura do desafio, a imigração será um factor de enriquecimento e irá fortalecê-las. Se o não conseguirem, isso pode ter como consequência uma descida do nível de vida e a divisão social. Não há a menor dúvida de que as sociedades europeias precisam de imigrantes. Nos nossos dias, os europeus vivem mais anos e têm menos filhos. Sem a imigração, a população dos Estados membros da UE, que em breve somarão 25, diminuirá, passando de cerca dos actuais 450 milhões para menos de 400 milhões, em 2050.
Isto não se passa apenas na UE. O Japão, a Federação Russa e a Coreia do Sul, entre outros, podem vir a conhecer um futuro semelhante - situações em que haverá cargos que ficarão por ocupar e serviços que não poderão ser prestados, à medida que se dá uma contracção das suas economias e as sociedades estagnam. A imigração só por si não resolverá estes problemas, mas é uma parte essencial da solução”.
“Gerir o fenómeno migratório não implica apenas abrir as suas portas e colaborar no plano internacional. Também exige que cada país desenvolva mais esforços para integrar os recém-chegados. Os imigrantes devem adaptar-se às novas sociedades que os recebem e estas têm igualmente de se adaptar. Só graças a uma estratégia criativa de integração dos imigrantes os países podem assegurar que estes enriqueçam a sociedade de acolhimento, em vez de trazerem instabilidade. Ainda que cada país aborde esta questão de acordo com o seu próprio carácter e cultura, nenhum deveria esquecer o enorme contributo que milhões de imigrantes deram já para as sociedades europeias modernas”

"Todos os que estão empenhados no futuro da Europa e na dignidade humana devem, por isso, tomar uma posição clara contra a tendência para fazer dos imigrantes os bodes expiatórios dos problemas sociais. Eles não querem viver à custa dos outros. Querem uma oportunidade justa para eles próprios e para as suas famílias. Não são criminosos, nem terroristas. São pessoas respeitadoras da lei. Não querem viver isolados do resto da comunidade. Querem integrar-se, mantendo, simultaneamente, a sua identidade própria. Neste século XXI, os migrantes precisam da Europa, mas a Europa também precisa deles. Uma Europa fechada seria mais egoísta, mais pobre, mais fraca e mais velha. Uma Europa aberta será uma Europa mais justa, mais rica, mais forte e mais jovem, desde que saiba gerir bem as migrações”.


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Como é sabido, os imigrantes foram já identificados no nosso País como um dos grupos alvo, pela sua particular vulnerabilidade à exclusão social (ver Plano Nacional de Acção para a Inclusão 2006-2008).
Entre outras medidas, para promover acções de apoio à criação de emprego, formação, qualificação e apoio técnico e financeiro junto de pessoas com particulares dificuldades de inserção no mercado de trabalho foi já adoptado o “Programa de Intervenção Mercado de Trabalho Inclusivo” .
Para além daquele, foi ainda adoptado o “Programa de Intervenção para Desempregados Imigrantes” (destinado a facilitar a inserção social, cultural e profissional dos imigrantes através do desenvolvimento de competências básicas no domínio da língua portuguesa e em cidadania, de acções de formação e apoios à criação de emprego).

Por fim, o Plano para a Integração dos Imigrantes veio definir um roteiro de compromissos concretos, com o objectivo de operar um “salto qualitativo eficaz nas políticas de acolhimento e integração dos imigrantes” e, por aí, afirmar o Estado português como o “principal aliado da integração dos imigrantes”.

Ora sabendo-se do compromisso político, tantas vezes reiterado nos últimos anos, de contribuir activamente para a integração plena dos imigrantes na nossa sociedade, assumido, aliás, em conformidade com as directrizes de Bruxelas, que pretende compensar e justificar a “ferocidade” da política europeia em matéria de admissão de nacionais de países terceiros ( a este respeito veja-se o caso da designada infame “Directiva do Retorno”) com políticas de integração generosas, a reforma do Código do Trabalho em curso, creio poder oferecer, sem dúvida, uma oportunidade para concretizar todas estas belas intenções ao nível juslaboral, não se justificando por mais tempo a ausência de um regime de tratamento específico do trabalho prestado pelos trabalhadores estrangeiros compatível com a manutenção do principio constitucional da equiparação entre nacionais e estrangeiros.

E crê-se que tal desiderato poderia traduzir-se, numa adequada revisão dos termos em que o actual Código do Trabalho consagra o princípio da igualdade de tratamento, aligeirando-se, em homenagem aos propósitos de simplificação e desburocratização, as formalidades exigidas para a celebração de contratos de trabalho com estrangeiros.


JMCM

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